“...
a calma tinha-se aproximado de mim como não me conhecesse... eu já
a conhecia há muito pese embora os grandes momentos em que não a
via ou não me encontrava com ela... porém, naquela vez, ela fez de
conta que não sabia quem eu era... aproximou-se mansamente e como
quem não quer a coisa, saudou-me ao de leve com um leve acenar pela
passagem, pelo encontro... não lhe liguei demasiada importância mas
educadamente correspondi ao seu aceno e sorri-lhe... foi nesse
momento que ela olhou para mim e, de chofre, me perguntou: - Porque
sorris?... Naquele instante não encontrei resposta mas uns segundos
após, saiu-me uma frase lenta e suave: - Porque não haveria de
sorrir?... Acho estranho, disse ela: Estás sempre preocupado, cheio
de problemas, a tua cabeça é um vulcão, a tua alma desespera, o
teu coração bate e os teus olhos não choram... Pois, respondi eu,
eu sei mas por vezes caio em mim e entendo que de nada me vale o
lamento; por certo que estou errado quando desfaleço e sentado ou
deitado me concentro nas agruras da vida; depois penso que a vida é
apenas aquilo que dela fazemos, aquilo que dela queremos, aquilo que
dela podemos tirar... a vida nada nos dá excepto ela mesma, ou seja,
ela se nos entrega numa única vez e após instalada em nós, somos
nós mesmos que a gerimos... temos esse poder, o poder de moldar os
dias, as horas, os minutos e até mesmo os segundos dos nossos
momentos aqui e agora, ontem e, quem sabe senão ela, também
amanhã... somos nós que decidimos enfrentar ou não o momento que
se nos depara, seja ele bom ou mau... é apenas uma questão de
escolha... mas tu não eras assim, disse-me ela, a calma... sim, eu
sei... na verdade, a vida foi tão diversa e tão cheia de coisas e
coisas que houve vezes em que não te consegui enfrentar ou mesmo
aceitar e desesperei... porém, houve também momentos em que soube
que me podias ajudar... por isso te sorri agora... sei que me podes
inundar e tornar-me pleno de mim mesmo e conceder-me ainda mais a
capacidade de me dar ainda mais do que já tentei... sei que me
ajudarás... porque me trazes a sabedoria, a sensatez, a alegria, a
ternura de me saber feliz ao sentir que amo, que o caminho que
percorro é o único que me pode serenar, o único que me pode
pacificar, a caminhada plena para amar... e, com amor, se ama e com
amor se preenche a nossa vida, mesmo para além da morte... por isso,
hoje, te sorrio por saber o quanto amo quem amo, quem me dá a
plenitude da serenidade, num amar terno e seguro, forte e puro, real
que de tão real, a ti o juro...”
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