"...hoje
só quero um abraço... um terno beijo... um dizer, estou aqui... um
sorriso espelhado bem fundo na alma ou mesmo do fundo do coração
(não será a mesma coisa?)... hoje só quero um olhar... a palma da
mão na palma da mão... um simples tocar... um roçar do dedo na
face, num tactear furtivo ou mesmo desajeitado... um movimento leve
dos lábios pronunciando a frase que ousas ouvir... hoje só quero
algo tão simples como o simples desejo de te ter aqui..."
terça-feira, 8 de dezembro de 2015
terça-feira, 10 de novembro de 2015
INTERVALO
"...
bendito o intervalo de tempo e de espaço que nos separa de quando em
quando... bendito o hiato entre o último abraço e o próximo, entre
o último beijo e o que em breve trocaremos... bendito o intervalo
que domina os nossos corpos quando eles se envolvem de novo numa
dança de amor e ternura, na dança em que se revelam de novo um ao
outro numa suave entrega e num delirante jogo de prazer... bendito o
intervalo que nos faz doer e ao mesmo tempo saber que nos amamos em
cada momento e milímetro do nosso ser... bendito o espaço que de
longe se faz perto na espera do espaço que nos aproximará em breve
e que, serenos na loucura da entrega, nos fará explodir na doçura
desse nosso tão relaxante sorrir... nesse abraço que sabemos será
apenas nosso ou nesse beijo que sabemos existir aqui bem dentro do
nosso coração, beijo que nos permite suportar esta longa e ao mesmo
tempo breve separação... bendito o intervalo que nos faz amar cada
vez mais..."
quinta-feira, 22 de outubro de 2015
MEL
“...
e o mel escorreu pela sua boa entreaberta
e nos lábios sedentos de beijos
o mel se aquietou
permitiu uma fuga para o seu queixo
e, de novo, para mim olhou
sorriu apenas com o olhar
semicerrando as pálpebras
bebeu-me a alma
e me iluminou o coração
permitiu-se tocar a minha face ao de leve
como terno e suave floco de neve
no momento em que a sua língua
rosada e húmida
provava o doce mel nos lábios
sedentos de beijos
senti sua boca roçar a minha boca
e a doçura do mel
adocicar o meu ser
era linda de se olhar
era bela de se ver
era pétala
era perfume
era grito
mas sem queixume
era loucura apenas
num abraço bendito...”...
e nos lábios sedentos de beijos
o mel se aquietou
permitiu uma fuga para o seu queixo
e, de novo, para mim olhou
sorriu apenas com o olhar
semicerrando as pálpebras
bebeu-me a alma
e me iluminou o coração
permitiu-se tocar a minha face ao de leve
como terno e suave floco de neve
no momento em que a sua língua
rosada e húmida
provava o doce mel nos lábios
sedentos de beijos
senti sua boca roçar a minha boca
e a doçura do mel
adocicar o meu ser
era linda de se olhar
era bela de se ver
era pétala
era perfume
era grito
mas sem queixume
era loucura apenas
num abraço bendito...”...
terça-feira, 6 de outubro de 2015
CARTA DE AMOR
“…tens
razão, meu amor: nunca te escrevi uma carta de amor… interessante
notar que mesmo num tom frio dito assim, sinto a dureza do saber que
algo tão simples ainda não foi feito… talvez não tenha jeito…
ou será apenas preconceito?... mas, na verdade, nunca te escrevi uma
carta de amor, daquelas que levam as mágoas e as saudades em
torrentes turvas de rios alterosos em direcção a um mar onde o
horizonte se confunde com as cores de majestosos tons… são cartas
de amor em que as palavras se confundem com os sentimentos que
queremos transmitir e não os sabemos… são cartas de amor em que
as palavras se misturam numa amálgama de tonalidades que não duram…
são cartas de amor que perduram no tempo sem um lamento mas onde o
sentir de um breve sentimento mais não é do que o dizer da palavra
em dado momento… são cartas de amor que não escapam ao
estereotipo dos sons que se ouvem na escrita e se escrevem com a voz…
o som que se debate dentro de nós sem sabermos que já não temos o
poder de gritar a sós… cartas de amor dizendo o que não é
preciso dizer… cartas de amor falando de coisas que sabemos sentir,
possuir, ver… cartas de amor com palavras que transmitem o toque, o
cheiro, a visão, o sabor e a audição dos nossos corpos em fusão…
na verdade, meu amor, nunca te escrevi uma carta de amor… uma carta
que repetisse o que desde o início sempre te disse: que te amo…
para quê então, meu bem, escrever o que já se sabe, o que já se
tem?... mas um dia vou tentar escrever-te uma carta de amor, uma
carta que te leve as palavras que me preenchem e se derramem sobre ti
num sabor a tudo o que qualquer homem e mulher podem querer: que se
amem a valer sem preciso ter de escrever uma carta de amor, perfeita,
bela, cheia de luz e de cor…”
sexta-feira, 18 de setembro de 2015
GRITO
...eu
tinha qualquer coisa para te dizer, algo que já anda dentro de mim
há milhares de anos e nunca tive essa oportunidade... ...há dias,
quando surgiste na minha vida, um pouco alheada do próprio mundo,
quando ali surgiste espelhada na minha alma, eu estive quase quase
para te dizer... ...penso que me faltou a coragem e a voz se me
embargou… calei dentro de mim o que deveria ter gritado; talvez
tenha esquecido a forma de gritar, talvez só saiba calar... não
sei... já não sei... ...mas eu tinha qualquer coisa para te dizer,
algo que me possui e me rasga a mente, num acto demente do meu
próprio ser de aqui estar sem saber falar, sem saber o que te dizer,
sem saber gritar o que tanto tenho calado... milhares de anos de
silêncio dentro de mim... ...milhares de anos de solidão da minha
própria voz… milhares de anos de espera que surjas ali à esquina,
em qualquer lugar, e num momento de paz eu te possa gritar todo o meu
amor... ...áhh dor que dói e me corrói a alma de tanto calar esta
tão louca forma de te amar... dor de aqui estar e não saber o que
te dizer, de não saber traduzir esta minha forma de tão somente te
sorrir... ...e sorrio-te a todo o instante, aqui, ali, em qualquer
lugar ainda que distante... não me preocupa se me ouves, se escondes
as palavras que tão docemente me são devolvidas porque não
enviadas… doces palavras de paz, ternura, carinho, amor... em doses
de candura mas eivadas de toda a minha dor... ...estão aqui, eu sei…
mas sei, também, que tinha qualquer coisa para te dizer… como
posso gritar se a voz se me tolda em silêncios ocos e sem eco ou se
com eco ecoam apenas dentro do meu vazio, um vazio que não preencho
ou se preencho apenas o preencho com a minha própria alma já de si
tão gasta por durante todos estes milhares anos não me teres dito:
Basta!...
sábado, 5 de setembro de 2015
O PRIMEIRO
"...
havia uma necessidade enorme de estar lá... não era somente desejo,
era mesmo imperativo, quase mais que obrigatório... mas sentia que
as pernas não se moviam e os braços estavam caídos numa postura de
desalento... deixei-me ficar assim ainda mais um momento... tentei,
então, mais uma vez, caminhar naquela direcção e fiz um esforço
enorme para conseguir mover um pé... sabia que nem era necessário
ter fé, bastava mover o pé... senti que uma fina dor me percorria a
coluna mas nem por isso deixei de tentar... era preciso ir, era
preciso caminhar... no fim do caminho estava apenas a meta a atingir
mesmo sem saber qual ela era; no entanto, era certo saber que estava
no fim da estrada, no meio do arvoredo... olhei em frente, sem frio,
sem aquele frio do medo... havia apenas uns braços abertos e um
sorriso na face; e uns olhos brilhando... ouvia um som repetido, uma
batida ritmada... esse som chamava-me, clamava por algo que eu não
sabia ser o que era... num tremendo e último esforço a minha perna
avançou e senti que a coluna se fixou... houve uma espécie de
tontura mas o esforço valeu a força precisa para fazer avançar o
outro pé... nesse momento senti-me cair mas não cheguei a tocar o
chão... uns braços fortes enlaçaram-me e elevaram-me no ar... só
muitos anos mais tarde vim a saber que aquele tinha sido o meu
primeiro passo..."
domingo, 23 de agosto de 2015
BELO, ERA ESSE PEDAÇO DE TERNURA NO TEU ROSTO
Tinha
eu treze anos quando ele acamou com uma dessas doenças que não
perdoam, mas que ele aceitou, consciente da sua pequenez neste mundo,
consciente que aquela era a vontade de alguém mais forte que toda a
força desta vida, para aquém e para além desta que temos.
Durante dois anos houve momentos de dor e houve momentos de paz; nesses momentos mais felizes de paz, lá ia eu de mão dada com ele passear um pouco para aliviar a carga psicológica que ele sabia carregar e aguentar firme como uma rocha; pequeno de estatura, e magro para além da magreza da própria doença, ele dava aqueles passos com a firmeza de um homem que nada tinha a temer e tudo tinha a enfrentar; ele dava aqueles passos com a firmeza de um homem que não tem medo de nada, nem daquilo que ele já sabia ter de enfrentar um dia.
Os seus passos pequenos, mas firmes, faziam compasso com os meus, ainda pequenos também pela idade ainda de criança, mas sentia-me como que o guardião daquele homem que naqueles momentos estava à minha responsabilidade e isso dava-me uma grande felicidade por estar a seu lado; também eu tinha consciência da doença que o minava pouco a pouco, também eu tinha forças para enfrentar aquela estranha harmonia de paz que nos rodeava aos dois; uma paz diferente, um bem estar compartilhado e interligado pelas duas mãos que se davam uma na outra, como dois cúmplices conscientes do "crime" que estavam a cometer a bem da harmonia e da paz de espírito, pois era carinho o que nos rodeava e envolvia.
Mas o dia da partida (ou da chegada como ele dizia às vezes por brincadeira) estava próximo. E quando esse dia surgiu ele teve consciência desse facto e soube-o enfrentar com uma dignidade que ainda hoje respeito e sempre respeitarei.
Deitado na sua cama e eu sentado a seus pés ele me olhou: os seus lábios já muito finos, mas firmes, disseram: "Vai chamar a tua Avó". Corri pelo corredor e fui chamar a minha Avó que, como sempre (toda a sua vida), estava agarrada aos tachos no fogão de lenha; na cozinha pairava um cheirinho a sopa quente (Meu Deus, que saudades !).
"Bó.. o vô chamou-a."
Ela largou o fogão, limpou as mãos ao seu avental e dirigiu-se para o quarto onde ele estava; segui-a logo.
Ela entrou no quarto e eu fiquei à porta vendo.
Naquele momento, todo ele se transformou: na sua frente estava a sua Maria de todo o sempre, a Maria que sempre o acompanhou e que lhe deu as quatro filhas que ele tanto amou, a Maria que tantas vezes ele arreliou e ela perdoou. Na ombreira da porta eu assisti: a sua face pálida ganhou cor, os seus olhos pequeninos brilharam de plena felicidade e a sua boca se abriu com um enorme sorriso ( o maior e mais bonito sorriso de felicidade que eu já vi em toda a minha vida !) e disse: " Maria, senta-te aqui."
Minha Avó se sentou à cabeceira da cama e ele com o mesmo sorriso disse já numa voz mais apagada: " Abraça-me."
Minha Avó o entrelaçou e eu vi os seus olhos pequeninos fecharem-se para todo o sempre, acompanhado com aquele sorriso lindo de felicidade !
Devia-te esta homenagem, Avô !
O teu neto Joaquim
Durante dois anos houve momentos de dor e houve momentos de paz; nesses momentos mais felizes de paz, lá ia eu de mão dada com ele passear um pouco para aliviar a carga psicológica que ele sabia carregar e aguentar firme como uma rocha; pequeno de estatura, e magro para além da magreza da própria doença, ele dava aqueles passos com a firmeza de um homem que nada tinha a temer e tudo tinha a enfrentar; ele dava aqueles passos com a firmeza de um homem que não tem medo de nada, nem daquilo que ele já sabia ter de enfrentar um dia.
Os seus passos pequenos, mas firmes, faziam compasso com os meus, ainda pequenos também pela idade ainda de criança, mas sentia-me como que o guardião daquele homem que naqueles momentos estava à minha responsabilidade e isso dava-me uma grande felicidade por estar a seu lado; também eu tinha consciência da doença que o minava pouco a pouco, também eu tinha forças para enfrentar aquela estranha harmonia de paz que nos rodeava aos dois; uma paz diferente, um bem estar compartilhado e interligado pelas duas mãos que se davam uma na outra, como dois cúmplices conscientes do "crime" que estavam a cometer a bem da harmonia e da paz de espírito, pois era carinho o que nos rodeava e envolvia.
Mas o dia da partida (ou da chegada como ele dizia às vezes por brincadeira) estava próximo. E quando esse dia surgiu ele teve consciência desse facto e soube-o enfrentar com uma dignidade que ainda hoje respeito e sempre respeitarei.
Deitado na sua cama e eu sentado a seus pés ele me olhou: os seus lábios já muito finos, mas firmes, disseram: "Vai chamar a tua Avó". Corri pelo corredor e fui chamar a minha Avó que, como sempre (toda a sua vida), estava agarrada aos tachos no fogão de lenha; na cozinha pairava um cheirinho a sopa quente (Meu Deus, que saudades !).
"Bó.. o vô chamou-a."
Ela largou o fogão, limpou as mãos ao seu avental e dirigiu-se para o quarto onde ele estava; segui-a logo.
Ela entrou no quarto e eu fiquei à porta vendo.
Naquele momento, todo ele se transformou: na sua frente estava a sua Maria de todo o sempre, a Maria que sempre o acompanhou e que lhe deu as quatro filhas que ele tanto amou, a Maria que tantas vezes ele arreliou e ela perdoou. Na ombreira da porta eu assisti: a sua face pálida ganhou cor, os seus olhos pequeninos brilharam de plena felicidade e a sua boca se abriu com um enorme sorriso ( o maior e mais bonito sorriso de felicidade que eu já vi em toda a minha vida !) e disse: " Maria, senta-te aqui."
Minha Avó se sentou à cabeceira da cama e ele com o mesmo sorriso disse já numa voz mais apagada: " Abraça-me."
Minha Avó o entrelaçou e eu vi os seus olhos pequeninos fecharem-se para todo o sempre, acompanhado com aquele sorriso lindo de felicidade !
Devia-te esta homenagem, Avô !
O teu neto Joaquim
quarta-feira, 29 de julho de 2015
POST MORTEN
"...
na verdade, esta moldura é a minha prisão... de tão perfeitos
traços me retrataste que me sinto afogada neles como se eles fossem
a minha própria alma, o cerne do amor que nos inundava enquanto a
vida me era dada para viver... lembras-te, meu amor, de todas aquelas
cartas que te escrevi enquanto presa dentro de outras grades, linhas
estreitas que me afastavam de ti ou que te afastaram de mim... nunca
soube o porquê e essa dúvida, que ainda hoje, aqui de cima
mantenho, será a minha companhia na eternidade... é ela também que
me concede a possibilidade de te ver aí olhando-me aqui nesta parede
nua, dentro de mim mesma vazia e tão prenhe de linhas com que me
vestiste naquela manhã na cozinha no banco sentada, rindo-me da tua
certeza... meu amor, a paz que me preenche não retira a dor que
mantive e que comigo trouxe... a paz que me preenche é uma paz por
amor a ti mas a dor essa jamais sairá de mim... é um pouco como eu
nestes riscos presente na tua mente quando daí em baixo me olhas...
resta-me a doçura da lágrima que vejo cair da tua face nesse chão
carcomido pelo tempo que não nos foi concedido... dor de mim em teu
peito também ele dorido..."
segunda-feira, 27 de julho de 2015
ENSAIO SOBRE A LOUCURA - ÚLTIMA CARTA
“…já
é habitual acordar a meio da noite… é sempre naqueles intervalos
entre o efeito das drogas que me dão… aproveitei sempre esses
momentos para te escrever, meu amor… porém, estou convencida que
esta será a minha última carta e, sinceramente, não sei o que te
quero dizer… meu amado, meu bem, meu doce, meu tudo, meu ser, minha
alma, minha única razão de existir: não sei sequer se irás ler
estas minhas palavras… como é hábito e tu sabes, devem ser 4 da
manhã… está na hora de mais uma dose e a enfermeira deve estar a
chegar… restam-me poucos minutos e estas serão as últimas que vou
poder te escrever… as outras cartas que te enviei, onde recordava
tudo o que de belo e bom tivemos durante os tempos em que estivemos
juntos, também não sei se foram parar às tuas doces mãos, (tão
doces de todas as carícias que me levaram ao êxtase e ao delírio,
tão suaves que eram, meu amor, tão doces que as sentia em mim como
se minhas fossem, como se me pertencessem desde sempre)… não sei
se te disseram como estou, não sei se sabes no que me tornei… mas,
há cerca de meia dúzia de dias (como se contam os dias aqui?… não
me perguntes porque não te sei responder…) ouvi-os dizer que já
não havia nada a fazer e que a única forma era o isolamento total e
final… vão, pois, privar-me da única coisa que tinha vinda do
exterior… a luz da lua nas noites frias porque sem ti e da luz do
sol gelado porque não a teu lado… tiram-me também o bater das
gotas da chuva que me faziam contar os segundos em que olhava o tecto
e recordava tudo o que fomos… vão, portanto, enviar-me para longe
de mim mesma, encharcar-me de drogas e mais drogas para que eu não
possa reagir e gritar como tenho gritado estes últimos anos…
gritado por ti, meu amor, gritado pela tua ausência, pelo amor que
tivemos, por tudo de bom que passámos, por tudo o que está gravado
na minha alma, na minha pele, no meu ser, na minha totalidade… como
dizer-lhes que não estou louca, como dizer-lhes que o que sou é
apenas o resultado do que fomos… como dizer-lhes que nada tenho
porque apenas e só tu me faltas e que nada mais desejo que não seja
o que um dia fomos… queria, antes de ir, antes (eu sei) de morrer
de falta de ti, olhar-te apenas mais uma vez; fixar teus olhos e
sorrir no teu sorriso… tocar teus lábios e tornar-me num beijo…
sentir tuas mãos nos meus seios e ser eu mesma esse toque… sentir
teu sexo me penetrar e ser eu mesma a penetração… meu amor,
apenas uma última vez e eu ficaria curada… mas tenho consciência
(sabes aquela consciência que nos resta no intervalo curto entre as
injecções) de que tal não vai acontecer e sei que o meu túmulo
estará naquelas 4 paredes sem grades porque sem janelas; já tinha
ouvido falar delas quando cá entrei… ouço passos; deve ser a
enfermeira do turno da noite… deve ser a próxima toma de mais um
calmante… o habitual, a norma, o gesto, o ritual, a morte em
ensaio… sei que já não vou ter mais tempo… o tempo terminou…
vou levar comigo todas as recordações que me restam porque nada
mais tenho nem nada mais quero: quero apenas que não me tirem a
recordação do som do teu riso, o sabor do teu toque, o brilho do
teu olhar… isso eles não me conseguem tirar… é isso o que vou
levar comigo… quando partir para sempre deste corpo físico que já
nada sente, irás dentro da minha alma e serei sempre feliz para onde
quer que eu vá, tu estarás lá… eu sei, meu amor, eu sei… me
despeço para todo o sempre… deixo-te a minha paz, a paz que obtive
na loucura do nosso amor, a paz que me toca ao de leve enquanto sonho
contigo… nada mais resta… perdoa-me por te ter amado tanto…
perdoa-me por não conseguir deixar de te amar… perdoa-me por te
levar comigo no meu coração… adeus, meu amor…”
a tua Maria
a tua Maria
quinta-feira, 23 de julho de 2015
ENSAIO SOBRE A LOUCURA - SEGUNDA CARTA
“…continuo
a acordar todas as noites… não há forma de o evitar… a tua
ausência incendeia-me os sentidos… a tua falta provoca-me esta
ânsia de te sentir presente… sofro neste sofrimento sofrido de dor
e solidão… já não sei quem sou… também não interessa…
lembras-te da última carta que te escrevi… sim, daquela em que
acordei às 3 e 15 da manhã?… Essa…sim, quando senti a tua
falta e me acariciei como se fosses tu que o estivesses a fazer… oh
meu amor, como sinto a tua falta!… Não, não sei que horas são…
até o relógio me tiraram deste sepulcro… olho pelas frinchas da
janela e vejo luar… não sei a quantos estamos… mas isso tem
importância?… Que valor terá o dia em que me encontro se não te
encontro num só momento?… Desespero neste tormento de sentir a tua
falta e não te sentir a presença… Como poderia sentir se tudo o
que sinto é dor?… Todos os nossos momentos me passam pela memória
e esta lembrança chora, chora como se fosse ela a minha própria
alma e eu não existisse… Aqui onde estou não me lembro do que
sou, só me lembro de ti e de todos os momentos em que estive contigo
e contigo vivi… Sim, agora não vivo, apenas recordo… Dizem que
recordar é viver… oh meu amor como pode ser viver se cada vez que
me lembro, sinto que estou a morrer… as tuas mãos estão aqui no
meu peito apertando-me os seios como tu tanto gostavas de fazer… a
tua boca na minha boca e a humidade da tua língua na minha língua…
o doce beijo nos meus mamilos e como as tuas mãos me penetravam com
doçura e força ao mesmo tempo… oh meu bem, como te amo tanto…
como te quero tanto… oh meu bem que lágrimas tão amargas estas
que broto a todo o momento… olha, devem ser 4 da manhã… vem aí
a enfermeira com a injecção do costume… continuam a dizer que
esta minha loucura não tem cura… eu sei que não tem, como poderia
ter?… Como me posso curar da tua ausência?… Como posso viver
nesta minha morte?… Não sei meu amor, não sei… A enfermeira me
aconchegou os cobertores… sabes, está frio e sinto frio dentro de
mim… já não consigo falar… apenas olho no vazio… neste vazio
que me preenche… Mas não preciso de mais nada, basta-me a
lembrança dos momentos que vivemos… basta-me esta dor que vive
comigo… bastam-me estas lágrimas… o meu pão de cada dia… o
meu alimento neste vazio… sinto os olhos pesados… sei que vou
dormir mais um pouco mas estou feliz pois vou dormir contigo nos meus
braços, nestes braços que não te sentindo te lembram, te tocam, te
apertam contra mim… lembras-te de quando adormecíamos assim?…
Como era bom acordar a meio da noite com os braços dormentes e
sentir o calor do teu corpo abrasar este meu ser que de tanto te
querer te perdeu… oh meu amor, como te amo… como sinto a tua
ausência… vou dormir… até mais logo… lembra-te de mim como me
lembro de ti… um resto de noite feliz, meu amor…a tua Maria”
segunda-feira, 20 de julho de 2015
ENSAIO SOBRE A LOUCURA
“…acordei
por volta das 3 e 15 da manhã… sim, era isso… olhei para o
relógio da mesinha de cabeceira e marcava 3 e 15… é um daqueles
relógios de ponteiros luminosos… olhei para o tecto sem saber
porque razão acordara, mas lembro-me que talvez tenha ouvido a porta
de um carro, lá fora, a bater ao fechar-se… olhei de seguida para
os buraquinhos das frinchas da persiana da janela e divisei a luz da
noite… a rua tem candeeiros e vê-se essa luz ainda que difusa…
Senti o corpo morno e passei a minha mão pelos meus seios
acariciando os bicos do peito… deixei a minha mão descer pela
barriga até sentir o meu sexo e desejei ter-te ali comigo… a minha
mão acariciou os pelos púbicos e lentamente introduzi um dedo na
minha vagina… deixei-me estar assim durante uns momentos e
lembrei-me de ti… lembrei-me de todos os momentos que te tive e que
a meu lado te senti… sabes, quando me abraçavas e me sentia
pequenina, dessa forma mágica que tinhas de me abraçar… quando me
beijavas e me sentia desfalecer ao sentir a humidade dos teus lábios…
sabes, não sabes?… sei que sim… lembras-te daquele dia em que
nos encontramos pela primeira vez?… o dia em que nos olhamos e os
nossos corações bateram?… aquele dia mágico que marcou o resto
dos outros nossos dias?… acordei sem saber por razão acordava mas
penso que a saudade marca o sonho e, se calhar, estaria a sonhar
contigo… lembras-te daquele dia em que estavas sentado no sofá da
nossa sala e me ajoelhei a teus pés?… lembras-te de termos feito
amor na mesa da cozinha?… lembras-te daquelas férias que tivemos
na montanha e lembras-te de certeza de termos feito amor deitados
naquele chão branco de neve… lembras-te de, no fim, teres lavado o
teu sexo com a fria neve que estava ao nosso lado?… lembras-te como
ele ficou pequenino por causa do frio?… lembras-te como nos rimos
às gargalhadas?… e daquele dia que fizemos amor no carro?… a
meio, deste um grito porque te aleijaste numa perna com o travão de
mão?… sim, porque não te haverias de lembrar, se eu me lembro tão
bem… e daquela outra vez na praia, escondidos numa duna, quando eu
fiquei cheia de areia… acordei às 3 e 15 e já são 3 e 40!… 25
minutos a pensar nisto… sinto-te em mim, meu amor e não estás
aqui presente… mas sinto-te… sei que sou eu que me acaricio mas é
como se fosses tu… sinto como se fossem as tuas mãos, o teu corpo
quente, o teu hálito a maçã que costumavas comer a toda a hora…
eras doido por maçãs… nunca soube porquê… nunca considerei
isso importante mas era importante para ti, não era?… os teus
beijos quentes e húmidos, num saltitar constante entre os meus
mamilos e a minha boca… como beijavas tão bem… mas sei que mesmo
que beijasses mal, para mim era sempre bom, doce, quente, por vezes
abrasador… como eu costumava dizer que acendias em mim o fogo da
lareira sempre acesa… eu sei que fui sempre “louca” por ti mas
tu sempre gostaste de mim assim… eu sei que sim… eu sentia que tu
gostavas de mim assim… tu também eras louco, sabias?… sim, a tua
loucura me incendiava e quando nos rebolávamos na cama parecia que
tudo se partia e a cama chiava… como nós nos riamos disso…
coisas giras e loucas, não eram?… meu bem, como me lembro de ti
assim?… porque acordei eu a pensar em ti?… porque é que ainda
penso em ti ou porque é que estou sempre a pensar em ti?… sabes
que não há um único momento da minha vida que não pense em ti?…
eu sei, eu sei que dizem que estou louca… mas eles não sabem que
já não estou louca, já estive, sim já estive louca por ti…
agora já não estou… estou feliz, triste mas feliz e tu sabes
porquê, não sabes?… sabes, eu sei que sabes… já são 4 da
manhã… acho que vou dormir um pouco… penso que vou sonhar
contigo e depois, depois voltar a acordar para pensar mais uma vez
nos nossos dias felizes, nos dias que passamos juntos, naqueles dias
em que a loucura era permitida e nada mais interessava… até ao dia
em que te foste… nunca soube porquê, porque me deixaste, porque
não me quiseste mais… porquê, meu amor?… o sono está a
regressar… sabes, deram-me mais uma injecção e vou ter de dormir,
sim?… vou dormir mais um pouco, meu amor… mais um pouco… mais
um pouco… como ainda te amo… sim, serei sempre a tua Maria, meu
amor… tua para sempre… para sempre…a tua Maria..."
terça-feira, 14 de julho de 2015
AMOR DE LOBOS
"...seriam
cerca das 3 da madrugada quando na esquina da velha igreja daquela
velha aldeia lá muito ao norte, quase a perder de vista a sua
própria existência, se juntaram em silêncio 4 esbeltas mulheres de
longos cabelos à solta, todas elas vestidas de branco... um branco
alvo, como vestidas de noivas, sem véus nem grinaldas mas de
branco... sentia-se um vento meio gélido naquele campo verde que se
estendia para além das traseiras daquela velha igreja daquela velha
aldeia... mas não se notou qualquer tremor de frio em nenhuma
daquelas 4 esbeltas mulheres... a cor dos seus corpos roçava a cor
do leite que, momentos antes haviam bebido dum mesmo canado... seus
olhos negros, profundos, brilhavam quando os raios do luar daquela
lua cheia lhes batiam nas faces em todo o seu fulgor... era uma lua
grande, de prata, brilhando num brilho baço mas ao mesmo tempo
ofuscante... deram-se as mãos umas às outras e continuaram o seu
caminho... para trás ficava tão-somente um cheiro a flores... seus
pés estavam nus e pareciam caminhar por sobre a erva daninha daquele
campo verde... lá ao longe, um pouco mais para cima, divisava-se um
morro e no cimo desse morro uma frondosa árvore, erguia os seus
ramos numa espécie de posicionamento de espera e de aceitação...
como que esperando por elas e pronta a abraçá-las... o silêncio
era total e entre elas não se ouvia um único som... quem as visse
de longe para cá daquela velha igreja daquela velha aldeia, pensaria
que as 4 visões voavam ou pelo menos deslizavam... cada uma das que
ficavam na ponta levava um cesto de verga coberto por pano branco de
linho feito... e eis que chegaram aos pés da árvore... pousaram os
2 cestos de verga no chão e deram-se as mãos num círculo que
abraçou o tronco da árvore frondosa e num misto de magia a árvore
como que se baixou sobre elas como que as cobrindo num acto fálico
enquanto as suas folhas roçavam os seus corpos... dos cestos, depois
de terem desfeito o círculo, tiraram algo que não era visível aos
olhos dos outros seres humanos e que não era possível descrever...
entretanto, algures, num outro ponto daquela aldeia, deitado numa
cama de doces sonhos, um homem alto, bem constituído fisicamente,
com o corpo nu coberto de pelos negros, dormia e via-se que estava
possuído por algum sonho de lascívio prazer, pois notava-se através
da roupa da cama que o cobria que o seu sexo estava excitado e
algumas gotas de suor lhe cobriam o peito forte... repentinamente,
num passe de feitiço, esse "sonho" transportou-o para os
pés daquela árvore frondosa onde se encontravam as 4 mulheres
lindas vestidas de branco... ele olhou para ele mesmo e viu-se nu,
tal como viera ao mundo e ao ver aquelas mulheres instintivamente
levou as mãos numa tentativa de tapar o seu sexo erecto... a partir
desse momento aquele homem entrou num espanto e seus olhos não
queriam crer naquilo que estavam a ver... elas se começaram a despir
e apenas tinham aquele vestido branco sobre as suas peles acetinadas
cor de leite... e ele olhava... elas começaram a sorrir e os seus
sorrisos eram como um convite ao sonho... daqueles cestos retiraram
uns frascos que continham vários fluidos e começaram a untar os
seus corpos... e ele olhava e começava a compreender o que via...
elas o fizeram ver... uma se untava de mel, uma outra de untava de
leite puro de ovelha uma outra de água salgada do mar e a outra de
um creme que cheirava a jasmim... e ele não resistiu e o sexo se
tornou novamente erecto e o seu corpo parou de tremer... aqueles
corpos untados cintilavam quando os raios da lua cheia lhes batia na
pele e elas continuaram com o ritual... todo o seu corpo foi untado
incluindo os seios, o pescoço, as pernas,... apenas os cabelos
soltos ficaram secos... então, elas se aproximaram daquele homem e
se roçaram por ele de tal forma que o corpo dele ficou totalmente
embebido daquela mistura de fluidos...apenas as mãos dele ficaram
secas... e num acto quase que instintivo elas se deitaram no chão
sobre os vestidos brancos que faziam de leito, o leito do Amor, o
leito da procura do Amor, o leito da descoberta do Amor... e ele se
misturou com elas e começou a possuí-las, uma a uma, e também numa
mistura arbitrária de escolha... o seu corpo confundia-se agora com
o corpo delas e já não existiam 4 mulheres ali... apenas existia
uma única mulher onde ele se fundia numa escolha impossível... os
ventres juntavam-se e os costados também... ele as tomou por detrás
agarrando-se aos cabelos delas com as suas mãos possantes e puxava
as cabeças delas num misto de prazer e dor, de agonia e êxtase,
como se tudo se pudesse perder num só instante, numa avidez de gozo
indescritível ... de repente ele sentiu os diversos odores que o
cercavam e aos poucos foi deixando uma a uma até que ficou olhando
aquela que cheirava a mar... e, nesse momento, algo de mágico se
passou: um raio de luar atingiu-o e ele numa nova forma de sentir,
viu lentamente o seu corpo transformar-se em lobo, um corpo coberto
de pelo sedoso negro e brilhante ao mesmo tempo que a mulher que
cheirava a mar se posicionava como fêmea do lobo... e ele a agarrou
pelos cabelos puxando a sua cabeça para o seu peito e com firmeza a
penetrou fundo num acto de posse total, num acto de prazer
inimaginável onde a fusão foi possível tão-somente por magia... o
seu corpo ofegou e o instinto animal veio ao de cima e, no mesmo
momento em que lambia todo aquele mar, ele, num último uivo
lancinante de prazer, espalhou sobre ela todo o fruto do seu Amor...
então os corpos se misturaram e apenas se divisava um casal de lobos
fazendo Amor... os seus corpos não conseguiam parar e num espasmo
final ela se transformou em maresia, como que alva espuma misturada
com o fluído dele... então, naquele silêncio de corpos se amando,
um último uivo, não o dele mas o dela, se fez ouvir por aquela
encosta abaixo, no preciso momento em que os primeiros raios de sol
começavam ao longe, bem perto daquela velha igreja daquela velha
aldeia, a despontar... nesse momento, o homem acordou de repente na
sua cama e olhou e viu: uma mulher linda, vestida de branco, dormia
profundamente ao seu lado..."
segunda-feira, 13 de julho de 2015
NA VERDADE
“… na
verdade, a net é um mundo novo, curioso, cativante e diferente… é
também
doce mas, ao mesmo tempo, perigoso… perigoso porque os sentimentos podem ser
"adulterados" na sua essência e serem mal compreendidos… não devemos descurar o mundo "lá de fora", o mundo real, aquele que vivemos de verdade e na verdade… é certo, que aqui, através do anonimato deixamos que os nossos medos se transformem em coragem e os nossos gritos possam ser gritados
bem lá do fundo da nossa Alma... este mundo serve para exorcizar os nossos "demónios", mas serve também para encontrarmos novos demónios e novos anjos… o problema está sempre em saber o que é um anjo e o que é um demónio (tudo em sentido figurado, claro)… eu escolhi uma forma de estar aqui, a de dizer apenas; a de ouvir apenas… a de tentar ajudar apenas; a de responder apenas; a de querer que todos me leiam e me ouçam apenas… a de desejar tudo de bom para todos apenas… e este "apenas" já é muito neste mundo… deixamos aqui impressa a nossa marca do ser que vive e que ri e que chora… deixamos aqui impressa a nossa marca de ser que é e de ser que não é… deixamos aqui impressa a nossa marca de ser o que sempre desejamos ser e não o que somos afinal... é um pouco uma peça de teatro sem actores visíveis... às vezes, estes actores encontram-se e criam-se novas vivências… umas vezes é bom, outras não… umas vezes é um doce, outras vezes é um amargo sabor... os problemas aqui vividos são problemas perante os quais nada podemos fazer… apenas podemos dar amor e querer amor… o caminho (seja de quem for) é para ser percorrido… seja que caminho for, não o podemos alterar nunca... a meta existe mas nunca sabemos qual é… o caminho é muito diverso mas tem de ser palmilhado… deixemos que todos palmilhem a rota que escolheram… não tentemos que a vida seja perfeita… aceitemos a vida tal como ela é… não se consegue alterar o que quer que seja… ela já está "escrita", não um destino escrito mas o caminho para lá chegar, está...
As "coisas" não são nunca "obtidas".
As "coisas" são-nos "entregues".
Saibamos viver o que a vida nos dá, da forma que ela nos dá, da forma como
ela se nos entrega de braços abertos… mergulhemos de alma e coração na
caminhada que temos pela frente e esperemos que a "perfeição" esteja no
caminhar e não no caminho que se percorre mas na meta que se alcança…”
doce mas, ao mesmo tempo, perigoso… perigoso porque os sentimentos podem ser
"adulterados" na sua essência e serem mal compreendidos… não devemos descurar o mundo "lá de fora", o mundo real, aquele que vivemos de verdade e na verdade… é certo, que aqui, através do anonimato deixamos que os nossos medos se transformem em coragem e os nossos gritos possam ser gritados
bem lá do fundo da nossa Alma... este mundo serve para exorcizar os nossos "demónios", mas serve também para encontrarmos novos demónios e novos anjos… o problema está sempre em saber o que é um anjo e o que é um demónio (tudo em sentido figurado, claro)… eu escolhi uma forma de estar aqui, a de dizer apenas; a de ouvir apenas… a de tentar ajudar apenas; a de responder apenas; a de querer que todos me leiam e me ouçam apenas… a de desejar tudo de bom para todos apenas… e este "apenas" já é muito neste mundo… deixamos aqui impressa a nossa marca do ser que vive e que ri e que chora… deixamos aqui impressa a nossa marca de ser que é e de ser que não é… deixamos aqui impressa a nossa marca de ser o que sempre desejamos ser e não o que somos afinal... é um pouco uma peça de teatro sem actores visíveis... às vezes, estes actores encontram-se e criam-se novas vivências… umas vezes é bom, outras não… umas vezes é um doce, outras vezes é um amargo sabor... os problemas aqui vividos são problemas perante os quais nada podemos fazer… apenas podemos dar amor e querer amor… o caminho (seja de quem for) é para ser percorrido… seja que caminho for, não o podemos alterar nunca... a meta existe mas nunca sabemos qual é… o caminho é muito diverso mas tem de ser palmilhado… deixemos que todos palmilhem a rota que escolheram… não tentemos que a vida seja perfeita… aceitemos a vida tal como ela é… não se consegue alterar o que quer que seja… ela já está "escrita", não um destino escrito mas o caminho para lá chegar, está...
As "coisas" não são nunca "obtidas".
As "coisas" são-nos "entregues".
Saibamos viver o que a vida nos dá, da forma que ela nos dá, da forma como
ela se nos entrega de braços abertos… mergulhemos de alma e coração na
caminhada que temos pela frente e esperemos que a "perfeição" esteja no
caminhar e não no caminho que se percorre mas na meta que se alcança…”
quinta-feira, 9 de julho de 2015
O UIVO
...Levantou-se
com um sobressalto, que a fez erguer a coluna num impulso sôfrego,
um nó de desespero atado na garganta. Segurou-a com uma das mãos,
como se contivesse a respiração ainda ofegante. A escuridão estava
toda emersa numa tonalidade azul, criando uma atmosfera quase irreal
no interior do quarto. Uma estranha luminosidade vinha do exterior, e
penetrava no quarto pelo espaço entre as velhas cortinas desbotadas.
Dirigiu-se à janela como se algo a chamasse. Espreitou por trás do
veludo envelhecido do reposteiro e viu um vidro quebrado, estilhaçado
no canto inferior esquerdo. Formava um desenho perfeito de uma teia.
Tocou-lhe e automaticamente levou o dedo à boca, sugando o sangue do
corte que acabara de sofrer. Soltou um breve gemido de dor, frustrado
de fúria. Lá fora, a lua erguia-se gigantesca, majestosa, rodeada
de uma aura azul intensa, que cobria todas as coisas de improváveis
reflexos. Sentiu um incómodo arrepio, como uma fria corrente
enferrujada a mover-se no interior da espinha. O espaço à sua
volta, de súbito, ganhava novos contornos. Estremeceu perante um
breve desacerto do mundo. Julgou ouvir ruídos, um estalar de
madeira, ecos de passos atrás de si, o som das sombras a mover-se
pelas paredes do quarto. Voltou-se e tremeu. Deu dois passos
incertos, esquecida do próprio corpo. O chão estava alagado; os pés
descalços enregelados. Ouvia uma torneira aberta, que pingava
lentamente. O som adensava-se segundo a segundo, ecoava pela casa
toda, cada vez mais próximo, cada vez mais grave, cada vez mais
alto, com requintes de tortura. Segurou a cabeça entre as mãos,
crispando os dedos entre os cabelos, tapando os ouvidos quase até ao
limiar da dor. Enlouquecia. Abriu as portadas e saiu. Correu para a
floresta que se estendia, negra e silenciosa, a sul da casa. Não se
vestiu. A camisa branca de algodão finíssimo esvoaçava enquanto
corria. Um som distante, longínquo, como um uivo, envolvia agora
todo o espaço entre as árvores. Tudo à sua volta permanecia
assombrosamente azul. Olhava para o céu e os seus olhos cintilavam,
fazendo perguntas às estrelas ausentes. Correu a um ritmo
alucinante, rasgando a noite escura com a sua deslumbrante figura
pálida. Se pudéssemos congelar o momento, encontrar-se-ia a mais
bela fotografia do mundo. Era atrás do lobo que corria. Um lobo que
conhecia sem nunca ter visto, que a chamava sem nunca ter tocado um
fio dos seus cabelos. Sonhara com ele durante seis noites seguidas,
um segundo mais cada noite, até que o sonho a puxou para dentro e
ela foi ao seu encontro. Correu atrás dele, movida pelo sonho,
dominada pela loucura. Corria como se perseguisse a própria vida, e
gritava. Gritava o nome do seu amor, como se lhe respondesse. Correu
até ficar sem forças, lentamente vergou os joelhos e deixou-se cair
no chão húmido. Tinha chovido nas horas anteriores, muito
certamente. Cravou as mãos na terra até que esta lhe doesse, negra
e perfumada, entre as unhas. Sentiu um frio muito fino percorrer-lhe
a parte de trás do pescoço, desde a nuca, descendo até à cintura.
Depois um calor imenso a escorrer-lhe pelos braços. Tinha o lobo
junto do seu corpo, o seu olhar ferido de medo. Aproximou-se do seu
rosto, conseguia sentir-lhe a respiração na face gelada. Mergulhou
os dedos finos no pêlo em redor do pescoço, num gesto ambíguo.
Como se segurasse, como se repudiasse. Sentia-o roubar-lhe o sopro de
vida, ao mesmo tempo que a alimentava de uma inexcedível sensação
de eternidade. A escuridão era tão intensa que a noite parecia
estender-se sobre todas as coisas, sem limites, insondáveis as suas
profundezas. Reinava uma calma inquietante. O seu coração pulsava
acelerado dentro do peito, o olhar num fervilhar insustentável de
paixão. Olhou à volta, demorando um segundo a reconhecer o espaço
do quarto. Um segundo depois, o outro lado do pesadelo: Está um
homem ao seu lado. Está frio. O branco dos lençóis tingido de
vermelho. Do corpo imóvel e pálido escapa-se um fio rubro e
espesso. O olhar preso no infinito. Um último gesto de angústia
suspenso na mão. A boca entreaberta, fixo nos lábios um suspiro,
com o nome do seu amor.
quarta-feira, 8 de julho de 2015
QUANDO SE SABE QUE SE AMA ?
“… há
dias escrevi-te dizendo as razões pelas quais te amo… escrevi
dizendo, afinal, que te amo porque te amo… mais tarde comecei a
pensar se existe um momento a partir do qual se começa a amar e se
esse momento existe, como sabemos então que se ama?... disse-te
também há tempos que o amor não tem tempo nem espaço pela simples
razão de que o Amor apenas, é… vive, subsiste,
existe, está… é algo definido, concreto mesmo não sendo físico
nem metafísico, o Amor é algo que é… sendo assim, não tendo o
Amor tempo nem espaço e sabendo nós que amamos, como se sabe que se
ama?... dediquei todo o tempo da minha vida à procura do Amor, na
busca constante do meu “Graal”, na demanda do porquê do se ser e
do se estar e das razões pelas quais aqui estamos… durante todos
esses anos procurei e um dia (não interessa quando porque o Amor não
tem tempo nem espaço) descobri que o Amor está (é) em cada um de
nós… não é nada que se descubra ou possua ou se encontre… ele,
o Amor, está em nós mesmos… se ele está em nós então ele é
nosso, de nossa pertença e faremos dele o que bem se quiser… daí
que, quando afirmo as razões pelas quais eu te amo, estou ao mesmo
tempo a dizer que te amo apenas porque sei que o Amor que está
dentro de mim, passa para ti… deixa de ser “meu” e começa a
“existir” em ti porque apenas e só, te doo esse Amor, numa
entrega sem pedir troca… dando-o, sei que o dou e nesse momento
passo a saber que te amo… assim, só existe uma única forma de
sabermos se amamos (ou quando é que sabemos que estamos a amar), é
sabendo que o Amor que estava em nós foi dado a outrem, entregue
simplesmente, como dádiva… e esse Amor pode estar num simples
gesto, num olhar, num acenar, num toque, num sentir, não se ser o
que éramos e passarmos a ser de outrem… nesse momento, quando nos
sentirmos parte do outro, saberemos que estamos a amar… em
contrapartida, quando soubermos que fazemos parte de outrem também
saberemos que estamos a ser amados… porque apenas e só, o Amor…
é...”
terça-feira, 7 de julho de 2015
FALTA
"...peguei
em mim mesmo e sacudi-me… esperei que saísse algo que tivesse a
mais… mas não caiu nada de mim… continuei a sacudir e ouvi algo
indefinido… era como que uma recordação dentro da minha alma ou
do meu coração… como saber?... peguei então em ti e despi-me de
ti… tirei-te de dentro de mim… coloquei-te ali ao meu lado e
olhei para ti… foi nessa altura que me senti nu... mas não
consegui vestir-te de novo… já não cabias dentro de mim… que
fazer então?... sonhos destruídos, caminhos não percorridos ou
teriam sido mesmo percorridos?... como é que não reconheço se os
percorri ou não?... confusão dentro de mim... sacudo as memórias
mas a força centrífuga da saudade as mantêm aqui dentro... fico
atento... espero olhar em frente, não me sentir demente, talvez
solidão somente… eternamente aqui ao meu lado presente... arrumo
os fatos que me vestem a alma e com calma procuro novas roupas que me
tapem a nudez que me enregela o corpo, como nado morto, triste e
absorto...
...quero ressuscitar, quero simplesmente me transformar, vestir-me de novo, olhar para o espelho e sorrir, cantar, bailar… pegar em mim e voltar a caminhar qualquer que seja o caminho que tenha ainda de palmilhar...
...é que os pés, mesmo de barro, ainda são os mesmos; cansados de andar, é certo, mas os que sempre me sustentaram de pé nesta tremenda e actual falta de fé..."
...quero ressuscitar, quero simplesmente me transformar, vestir-me de novo, olhar para o espelho e sorrir, cantar, bailar… pegar em mim e voltar a caminhar qualquer que seja o caminho que tenha ainda de palmilhar...
...é que os pés, mesmo de barro, ainda são os mesmos; cansados de andar, é certo, mas os que sempre me sustentaram de pé nesta tremenda e actual falta de fé..."
quinta-feira, 2 de julho de 2015
MEMÓRIAS
“…encosto
a cabeça no vidro semiaberto e fecho os olhos por segundos; pela
frincha sai o fumo do cigarro ao mesmo tempo que as gotas da chuva
varrida pelo vento tenta entrar com força. Não há lágrimas que se
comparem às que batem no tejadilho do carro; o vento sopra forte de
sul e as ondas alterosas mostram-me um mar agitado porque de si
próprio aquelas lágrimas haviam saído uns dias antes. Percorro a
visão até ao horizonte cinzento-escuro e vejo um relâmpago descer
sobre as águas. Imagem bela e soberba. O céu zangado como me
ensinaram em criança. O interessante era terem mais medo do trovão
do que do relâmpago. Havia uma cantilena que rezavam fechadas no
quarto; algo que no meio das palavras comidas pela reza eu percebia
algo como santa bárbara; mais tarde vim a saber que Santa Bárbara
tem a ver com as trovoadas, dizem. Imagens da infância que recordo
com saudade. Um corpo deitado no chão da sala, uma chupeta e um
açucareiro ao lado; e lá ia eu molhando a chupeta no açúcar e
chupando; ainda hoje gosto de comer açúcar. Um corpo escondido no
meio do centeio que não se dobrava pelo vento; um corte num pé
provocado por um vidro escondido. Umas mãos pequenas pegando nas
pombas que existiam no pombal do pai. Uma gaveta com postais antigos
do Brasil que meu avô trouxera. Um retrato enorme dele e de minha
avó no dia em que casaram, pintado a carvão. Era imponente. Um
fogão de lenha crepitando. A chuva que entrava pelo vidro começou a
molhar-me a face e a cabeça e o cigarro já me estava a saber mal.
Liguei o motor, fiz marcha-atrás e arranquei dali para fora. Para lá
do mar ficava o sonho, o sonho que sempre tive de o enfrentar, o
sonho que sempre tive de me meter dentro dele e o amansar. Nunca
conseguido. Os faróis foram ligados porque a penumbra já era
demasiadamente escura para ser dia. A noite que se aproximava iria
brindar-me com mais recordações; é isso que faço para adormecer
todas as noites; relembro imagens distantes e tento reconstruir a
vida que já não existirá nunca mais. Puzzles de imagens, de sons e
de choros e de risos, de quedas, de corridas, de corpos cheios de
calor abraçando-nos. Porque me faz tanta falta esse abraço de
outrora? A estrada à minha frente ainda era longa e a noite me
esperava…”
quarta-feira, 1 de julho de 2015
FRIO
“…tenho
frio, tenho mesmo muito frio… sinto um arrepio dentro de mim que me
faz encolher a alma… dobro-me sobre mim mesmo e procuro a razão do
frio que sinto… sinto-me cheio de um vazio que se instala no meu
cérebro e deste passa para o meu ser… sinto-me entorpecer e as
pernas dobram-se e enregelam… o frio que sinto faz-me tremer… não
vejo sol dentro de mim e a lua passou já muito ao largo e não
deixou rastos… as estrelas estão longe e não me iluminam o
suficiente para aquecer o meu coração… é tudo em vão… todo o
esforço que faço para me manter à superfície ainda me magoa mais
porque as forças me abandonam e o corpo rejeita energias que gasto
nesta viagem… e é apenas a minha imagem… mas olho para lá e não
vejo nada que me faça regressar… e desejo cada vez mais sair,
fugir mesmo sem saber para onde ir… não é dilema não saber o que
aí vem… sabe-se que se está a ir nessa direcção e deixa-mo-nos
ir como folha perdida nas águas turbulentas de uma sarjeta suja de
pó e vazia também de tudo… deito-me dentro de mim e adormeço no
meu sonho sem dormir… é um sonho acordado de tão cansado que nem
o sono sossega e não me dá trégua… tenho frio, tenho muito frio…
sinto um arrepio de novo e mais uma vez me encolho e olho para dentro
do copo que tenho na mão… é um copo vazio como eu e também está
frio… peço a alguém que o encha de novo e dizem-me que não, que
já bebi demasiado… mas eu sei que não, ainda consigo entender o
que me é dito e porque razão ouço este imenso grito… tenho frio,
tenho muito frio… saio num tropeço dum trôpego andar… passo
pelo espelho e alguém do lado de lá olha para mim e sorri… é
alguém que eu já conheci, alguém que já esteve aqui comigo,
dentro de mim… nunca mais o vi… por onde andará?… no entanto,
foi simpático, acompanhou-me até à saída… não o vi mais… não
havia mais espelhos naquela sala daquele bar… abri a porta de par
em par… respirei o ar frio da noite ainda mais quente do que o frio
que eu sentia dentro de mim… olhei o mar que se estendia para lá
daquelas escadas que desciam para ele, ele que me esperava depois do
abismo… olhei-o e ele riu-se numa risada tremenda que me fez
encolher e de novo ver que já nada estava ali a fazer… preciso de
dormir, mas um sono que jamais termine… preciso de dormir e afinal
o carro está ainda ali… é aquele preto… tem aros prateados nos
faróis mas não tem luz, estão apagados como eu… a chave está na
minha mão e abrir a porta não custa… já nada me assusta porque o
frio me tira a percepção da realidade… tenho apenas uma vontade,
dormir, deixar-me ir e não saber nem como nem para onde… tenho
frio, tenho muito frio…”
terça-feira, 30 de junho de 2015
NUDEZ
“… porque
te sentas de pernas cruzadas sobre a nudez do teu silêncio?… para
te ouvires desejando não ouvir o que não és capaz de pensar?…
porque te sentas de costas voltadas à treva se da treva vem a luz
que te cega?… para não olhares, para não veres o que sempre
desejaste ver?… porque me dizes que sim quando do teu peito sai um
gritante não?… para não teres de balbuciar um talvez?…porque
pensas que pensas o que não pensas?… para pensares no que eu
penso que tu pensas?… não, o melhor é mesmo não pensares…
porque sentes que a vida te foge por entre os dedos se as tuas mãos
estão presas e cheias de dúvidas?… porque desejas libertação se
o que intimamente queres é estar quieto na bonomia do turbilhão?…
porque calas o teu grito se do fundo da tua mansarda revelas a
negrura da alma que te compõe o sentir?… porque não mentes se é
tão doce mentir?… porque não calcas a doçura do mel?… porque
não espezinhas a palavra calada?… porque não escreves o nada que
tens para dizer?… que te disse eu que tu já não soubesses?…
aprendeste algo mais para além daquilo que já não sabias?… que
sabes tu da ignorância que te cerca se a certeza de saber é apenas
uma incógnita que nos abala a consciência de nada sabermos, ou
apenas de sabermos que nada sabemos?… porque te manténs sentada de
pernas cruzadas sobre a nudez do teu silêncio?…”
segunda-feira, 29 de junho de 2015
DOCE
“… deixa
enroscar-me nos teus braços… coloca tua mão na minha cabeça e
enrola os teus dedos nos meus raros cabelos… baixa um pouco a tua
fronte e beija a minha boca… deixa enroscar-me no teu colo…
sentir a tua maciez e ver de baixo para cima o teu sorriso… ver-te
junto a mim e saber-te ali comigo… de tal forma que quando olhas eu
sou o teu olhar… de tal forma que quando sorris eu sou os teus
lábios… de tal forma que quando me afagas eu sou a tua mão… de
tal forma que quando me tocas eu sou o teu corpo… de tal forma que
quando me olhas eu sou o teu olhar… deixa pousar o meu cansaço na
tua serenidade e sentir a tua paz na minha guerra… baixar as armas
e sentir a trégua na tenda que se ergue no deserto da batalha…
humedecer as mãos na brisa da água que corre no ribeiro que nos
circunda… lavar a cara na frescura do vento que nos embala…
sentir que nem tudo é real mas que o sonho nos preenche… sentir
que, por vezes, só o desejo chega, só o querer basta, só o pensar
nos satisfaz… deixa-me ser não só a realidade mas também o que
não somos… deixa-me olhar para dentro de ti e ver-me inteiro…
deixa-me tocar-te com o sonho e saber-me parte dele como sei que ele
é uma parte do meu eu verdadeiro…”
sábado, 27 de junho de 2015
ANATOMIA DO BEIJO
“…coloco
um beijo na palma da minha mão e olho-o para o estudar, para o
entender, para saber algo mais sobre ele… a sensação é apenas de
toque suave dos meus lábios na palma da minha mão… nada mais
retenho que o saber que senti a minha pele tocada pela minha própria
boca… preciso saber mais sobre o beijo… examinar minuciosamente
de forma a sentir o beijo como algo físico, palpável, real…
então, aproximo-me de ti e olho-te nos olhos, nesses olhos que
brilham dentro de mim como se tu não estivesses ali mas aqui, como
se tu fosses parte do meu ser… toco-te com as minhas mãos nos teus
ombros e dou um passo em direcção a ti… tua face serena, abre-se
num sorriso… levo a minha mão aos teus cabelos e acaricio-os
deslizando na seda dos mesmos… os nossos corpos encostam-se ao de
leve num toque global presente sem ausência de sentidos, bem pelo
contrário, com os sentidos todos em alerta… olho a tua boca
entreaberta nesse sorriso que me encanta e seduz… és luz… és
sol… és brilho em meu redor… humedeço meus lábios e
aproximo-me lentamente da tua face… toco com eles ao de leve na
pele que reluz perante o meu olhar… sinto o sal… um sabor leve a
mar… os meus lábios tocam as tuas pálpebras fechadas para receber
o meu beijo… sinto um suave sentir, um sorrir no olhar como se de
outra boca se tratasse… retiro a minha boca e olho-te de novo…
preciso saber o porquê do beijo saber a tudo o que tu és, numa
dimensão de ser paz, doçura, mel e mar… vejo-te humedeceres os
teus lábios e muito suavemente toco-os com os meus… mantenho a
minha boca ao de leve no teu lábio superior e de seguida saboreio o
teu lábio inferior… e sinto amor…sinto que preciso de sentir
mais, de saber mais e melhor o porquê da paixão… é nesse momento
que toco em completo a tua boca e saboreio o mel que tal sensação
me transmite… as línguas tocam-se ao de leve para em seguida se
fundirem num só beijo, num só toque… já não são duas bocas que
se beijam pois é apenas o beijo em si mesmo que ali se encontra, se
forma, se transmuta, se torna ávido e sereno ao mesmo tempo…
mantemos o sentir tais sentidos, leves, lábios mordidos, línguas
entrelaçadas e o sabor doce penetrar em permuta o âmago daquela
sensual luta de pele com pele, de alma com alma, de corpo com corpo…
e a paixão nasce daí e cresce em mim como em ti… saboreamos o
momento… entramos em transe e deixamos de ser quem somos… e o
beijo perdura num planar de doçura… e o beijo se torna dono de nós
num galopar de sensações plenas, profundas mas de tal forma suaves
e serenas que o beijo deixa de ser beijo para passar a ser desejo…”
sexta-feira, 26 de junho de 2015
AMO-TE
“…amo-te
porque te amo… porque me sinto bem quanto te olho… quanto te
toco… quando te beijo… quando sinto a tua pele perfumada junto da
minha… quando te vejo sorrir para mim… quando ouço a tua voz…
quando te ris… quando me tocas, me acaricias e me fazes sentir
homem… amo-te quando me dizes que também me amas, quando me dizes
gostar de mim, quando me olhas e vejo no teu olhar a tua alma e o
reflexo da
minha… quando sabemos que nada mais no mundo nos importa… quando
sentimos que tudo o que gira à nossa volta está parado e somos o
centro de tudo… amo-te quando te digo que te amo, quando te
sussurro palavras ternas, quando ouço as que me dizes… amo-te
quando me dás um mimo, um sabor, o roçar ao de leve ou mesmo forte…
amo-te porque te amo… porque te sinto bem quando me olhas… quando
me tocas… quando me beijas… quando sinto que sentes a minha pele…
quando te sorrio… quando ouves a minha voz… quando me rio…
quando te toco, quando te acaricio e te faço sentir voar… amo-te
quando estou aqui ou aí… amo-te mesmo quando não estamos ou não
somos… amo-te porque sei que te amo, porque sinto que te amo,
porque vivo esse amor duma forma terna, doce, suave e pura mesmo
quando os corpos se entrelaçam e vibram em loucura… amo-te assim,
tão simples…tão tudo em ti e em mim…”
quinta-feira, 25 de junho de 2015
PURA SEDA
“… o
teu corpo perfeito, deitado no leito, de pura seda acetinada feito,
exalava o perfume perfeito… deixava antever, sem te tocar nem
sentir, o esbelto prazer de olhar para ele e bastar sorrir… mais
não seria necessário se a força do desejo se quedasse por ali…
mas a languidez da libido perfurava todo o sentido em te possuir…
aproximei-me de ti sem te olhar e sem que me visses… era apenas um
desejo que bastava que sorrisses para que eu parasse e não
prosseguisse… mas os teus lábios carnudos abriram-se em pétalas
desnudos e me sorriram num convite perfeito… o ardor estava ali, a
teus pés e meu corpo teceu o desejado amor de tudo o que depois
aconteceu… volteámos a alma, os sentidos, a voz rouca, o arfar da
pele, o toque no teu mar e o saboroso doce a mel… perfurei tuas
entranhas em doces movimentos com forças tamanhas que te fizeram
sugar teus próprios gemidos… a doçura perdura dentro de nós e
antevê-se nos nossos olhos o desejo de, novamente, a sós, voltarmos
a ser um só corpo e um só desejo num derradeiro lampejo de profunda
paz… o deleite do amor que ele nos traz…”
quarta-feira, 24 de junho de 2015
O TEU SONHO
“…Em
frente ao espelho da cómoda do teu quarto, sentada num banquinho
forrado a tecido de cortinado vermelho, penteavas os teus cabelos,
num ritual que funciona mesmo sem dares por isso… a escova passava
ora uma, ora duas vezes, de cima para baixo e alisava os teus cabelos
sedosos, cor de mel e de marfim… brilhavam no espelho e te revias
momento a momento numa expectativa de mudança, o que não acontecia
pois não podias ficar mais bela do que aquilo que já eras… a
beleza em ti não residia nem morava … era!… A tua camisa de
noite, acetinada bege, de rendas sobre o peito alvo de seios firmes e
redondos, deixava transparecer a cor da tua pele suave e doce ao
olhar sem ser preciso tocar… a tua cama de lençóis de prata,
aguardava o teu corpo numa ânsia lasciva de quem à noite, só, te
espera num desespero de intocabilidade… e tu, demoravas… da
cómoda tiraste um frasquinho de perfume e te ungiste com ele o que
provocou um agradável respirar a todos os móveis que te rodeavam…
e a tua cama, ansiava pela tua presença… e o teu corpo demorava a
conceder-lhe esse desejo… levantaste-te de frente do espelho e te
miraste novamente de corpo inteiro e gostaste da tua imagem alva e
bela naquele quarto iluminado pela tua presença… olhaste de
soslaio e sorriste… sentaste-te na beira da cama e esta suspirou
docemente perante a antevisão de que breve te possuiria… Tiraste
os teus pézinhos leves de dentro dos chinelos de cetim vermelho,
levantaste um pouco o lençol e te entregaste total e lentamente ao
prazer de estender do teu corpo e da entrega final ao teu leito… a
tua cama nem sequer se moveu… aquietou-se para não te perturbar,
para que não te arrependesses daquilo que acabaras de fazer, com
medo que te levantasses e ela te voltasse a perder… a tua cama
inspirou baixinho a fragrância do cheiro da tua pele e deixou-se
ficar aguardando o teu próximo movimento… deitada de bruços te
deixaste finalmente ficar e tua cabeça leve pousada de mansinho na
almofada, arfava lentamente o teu respirar de prazer por mais uma
noite de descanso e de sonhos… Teus olhos semicerrados viram a
lâmpada acesa e teu braço se estendeu ao interruptor da mesinha de
cabeceira para a desligares… os teus movimentos eram
propositadamente lentos para que o tempo demorasse ainda mais do que
aquele que já existia… e a tua cama sentia… na obscuridade do
teu quarto, teus olhos semicerrados olharam o tecto e se fixaram na
sua alva cor que permitia uma réstia de luz no meio da escuridão…
olhaste a janela e pelas frinchas da persiana, divisaste a luz
cinzenta duma lua crescente… avizinhava-se uma noite de lua cheia e
teu corpo descansou por um momento… a tua cama então suspirou e te
abraçou fortemente… em suas mãos te acabavas de entregar… e o
sono chegou…. adormeceste… não sei mais o que se passou… a
noite decorreu, teu corpo diversas vezes se moveu… a tua cama não
se movia, com receio de te acordar… abraçava-te sempre para não
te deixar fugir… sentia-te sua e possuía-te num sonho imenso de
impossibilidade, de impotência, de raiva, por não te conseguir ter
tendo-te ali… tua mente adormecida, movia-se e sabia-se que
sonhavas… a tua cama te tinha ali, indefesa, sozinha… sonhavas e
eu aqui, nada mais te pedia… nada mais desejava… queria apenas
ser o teu sonho…”
terça-feira, 23 de junho de 2015
ESTRELAS
“… e
as estrelas chegaram e trouxeram-me o suave sorriso dos teus lábios…
e vinha com a claridade prateada da lua que se escondia da tua
beleza… e as estrelas me trouxeram a doçura do teu olhar em arcos
de luz, essa claridade da tua alma que tanto me seduz… e vinha com
o brilho da tua pele macia como a seda que qualquer bicho-da-seda
teceria… e as estrelas chegaram e me presentearam com o calor doce
do teu toque… sentir-te é uma benção que traz a paz ao deitar
meu enlevo no teu regaço e, sem espaço, vinha o luar espreitar…
sorria ele ao ver-te chegar e sabia ele da minha alegria em te
receber, plena de luz e de amor que qualquer deus sabia antever…
abristes os braços e te deste em sintonia com a veste que não
trazias… não precisavas pois tu mesma eras todos os véus que
cobrem as estrelas de todos os céus… sorrias nessa entrega plena
de dádiva que eu tanto queria… estavas ali, cheia de ti, pronta
para mim… porque as estrelas te trouxeram num mar de pétalas de
uma doce rosa em qualquer jardim… o meu…”
segunda-feira, 22 de junho de 2015
SAUDADES
“…Tenho
saudades tuas… Queria ter-te aqui comigo, a meu lado, de mãos
dadas ou de olhos nos olhos… Cingir-te a cintura e apertar-te
contra mim e sentir teu corpo… Desejar o teu desejo… Ouvir teu
coração bater com a minha face sobre o teu peito… Beijar-te a
boca e saber-me dentro de ti… Sentir-me mais uma vez como as muitas
que senti… Tenho saudades tuas… Chamar pelo teu nome… Ouvir a
minha voz pronunciar esse som e saber-me respondido com o teu sorrir…
Estar onde estás e saber-me contigo, aberto de mim para te receber
em plenitude… Entrar no teu ser e saber-me lá residente, não
ontem nem hoje mas, sempre… Perder-me no teu labirinto e jamais
encontrar a saída… viver os caminhos e as esquinas que se
cruzassem à nossa frente e deixar de conhecer o tempo que nos cerca…
olvidar a dor da ausência do teu doce amar… Tenho saudades tuas…”
sábado, 20 de junho de 2015
A CAIXINHA DE MARFIM
“…eram
extremamente apelativos… estavam ali à minha disposição… em
cima da mesinha de cabeceira… era uma caixinha escura que ela usava
para ter à mão os comprimidos que a faziam dormir… nunca liguei
qualquer importância ao valor daquela caixinha e, no entanto, ela
continha o passaporte para uma viagem, uma sem retorno… nunca
houvera pensado nisso, exceto naquela noite… uma noite em que ela
não estava ali deitada comigo (nunca mais estaria)… uma noite em
que acabara de chegar de mais um bar e depois de ter ingerido um bom
pedaço de álcool para me aquecer a alma tão fria e tão dormente
que já nem a sentia… também, para que queria eu uma alma?… que
é que ela me dá ou me faz?… a caixinha preta continuava ali…
quantos comprimidos teria ela deixado desde a última vez que a
encheu depois de os tirar da embalagem de marca do medicamento?… a
minha mão direita estendeu-se para aquela caixinha preta tão
apelativa como tão consoladora pelo imaginário que já me estava a
provocar… não custaria nada e dormiria para sempre… tão bom…
era disso que eu estava a precisar ou seria de mais um pouco de gin?…
mas para tomar os comprimidos eu precisava de beber alguma coisa e
essa coisa estava também ali à mão… debaixo da cama, talvez
também deitada no chão por cima do tapete… teria ainda algum
líquido?… o suficiente para engolir os comprimidos?… já não
tinha forças para me levantar e ir buscar outra garrafa… a
caixinha preta continuava ali e a minha mão já estava em cima dela…
senti aquela textura (penso que era marfim) sob os meus trémulos
dedos mas senti-a fria e um arrepio percorreu-me a coluna… ou teria
sido outro tipo de arrepio?… não sei quanto tempo estive com
aquela caixinha na mão… não sei quanto tempo demorei a tomar uma
decisão… não sei quanto tempo a olhei com um turvo olhar… não
sei porque razão não a segurei… dei por mim a olhar para ela sem
saber para que é que ela servia e naquele momento apenas me apeteceu
dormir… tão perto do derradeiro sono… tão desejado… ali tão
à mão… reparei então que estava deitado sobre o lugar dela com o
braço direito estendido para a mesinha de cabeceira segurando a
caixinha preta que continha o passaporte para a derradeira viagem…
tantas vezes assim estivemos… tantas vezes senti o seu calor, o seu
respirar, o seu arfar… tantas vezes assim ficamos depois de
fazermos amor… e, neste estúpido momento, repetia aquela posição
estendendo a minha mão para uma viagem… não consegui conter o
choro… não consegui aguentar as lágrimas… não consegui segurar
a caixinha preta… não consegui partir… restou-me a certeza que
no dia seguinte teria mais uma noite de frio…”
sexta-feira, 19 de junho de 2015
SERENO
“...
a calma tinha-se aproximado de mim como não me conhecesse... eu já
a conhecia há muito pese embora os grandes momentos em que não a
via ou não me encontrava com ela... porém, naquela vez, ela fez de
conta que não sabia quem eu era... aproximou-se mansamente e como
quem não quer a coisa, saudou-me ao de leve com um leve acenar pela
passagem, pelo encontro... não lhe liguei demasiada importância mas
educadamente correspondi ao seu aceno e sorri-lhe... foi nesse
momento que ela olhou para mim e, de chofre, me perguntou: - Porque
sorris?... Naquele instante não encontrei resposta mas uns segundos
após, saiu-me uma frase lenta e suave: - Porque não haveria de
sorrir?... Acho estranho, disse ela: Estás sempre preocupado, cheio
de problemas, a tua cabeça é um vulcão, a tua alma desespera, o
teu coração bate e os teus olhos não choram... Pois, respondi eu,
eu sei mas por vezes caio em mim e entendo que de nada me vale o
lamento; por certo que estou errado quando desfaleço e sentado ou
deitado me concentro nas agruras da vida; depois penso que a vida é
apenas aquilo que dela fazemos, aquilo que dela queremos, aquilo que
dela podemos tirar... a vida nada nos dá excepto ela mesma, ou seja,
ela se nos entrega numa única vez e após instalada em nós, somos
nós mesmos que a gerimos... temos esse poder, o poder de moldar os
dias, as horas, os minutos e até mesmo os segundos dos nossos
momentos aqui e agora, ontem e, quem sabe senão ela, também
amanhã... somos nós que decidimos enfrentar ou não o momento que
se nos depara, seja ele bom ou mau... é apenas uma questão de
escolha... mas tu não eras assim, disse-me ela, a calma... sim, eu
sei... na verdade, a vida foi tão diversa e tão cheia de coisas e
coisas que houve vezes em que não te consegui enfrentar ou mesmo
aceitar e desesperei... porém, houve também momentos em que soube
que me podias ajudar... por isso te sorri agora... sei que me podes
inundar e tornar-me pleno de mim mesmo e conceder-me ainda mais a
capacidade de me dar ainda mais do que já tentei... sei que me
ajudarás... porque me trazes a sabedoria, a sensatez, a alegria, a
ternura de me saber feliz ao sentir que amo, que o caminho que
percorro é o único que me pode serenar, o único que me pode
pacificar, a caminhada plena para amar... e, com amor, se ama e com
amor se preenche a nossa vida, mesmo para além da morte... por isso,
hoje, te sorrio por saber o quanto amo quem amo, quem me dá a
plenitude da serenidade, num amar terno e seguro, forte e puro, real
que de tão real, a ti o juro...”
quinta-feira, 18 de junho de 2015
ACENAR
"...
o tempo passa demasiadamente depressa... quando damos pelo facto,
seja ele qual for, o tempo esvaiu-se e quase não o vimos passar...
quando não o vemos passar porque ele foi usado em positiva vivência,
é óptimo recordar esses momentos que não vimos passar porque o
tempo estava a ser ganho por algo bom que recordaremos com prazer...
porém o tempo voa e quando damos por ele, ele já passou e já são
horas de dizer um novo adeus, um até breve, um até depois... fica o
sabor de tudo o que se viveu... fica a saudade desses momentos...
fica a ânsia de que eles voltem depressa mais uma vez... e quando o
tempo de viver esses doces momentos acaba, fica em nós a presença
do outro, o cheiro, o sabor, o tacto, o som e a imagem que fixamos
com ternura para, no mínimo, a levarmos dentro de nós... até ao
próximo encontro... no entretanto, fica o aceno, o olhar para trás,
o dizer aquele adeus com a mão estendida e o rosto, apesar de tudo,
sereno e com um sorriso nos lábios... o acenar até que a esquina
surge e o passo continua calmo no percorrer daquela rua..."
quarta-feira, 17 de junho de 2015
ENSAIO SOBRE A SOLIDÃO
“…depressa
me canso de mim… olho à minha volta e só vejo recordações…
uma terna claridade invade o meu quarto e me rodeia de mansinho… já
reparei várias vezes: vem sempre acompanhada do silêncio!… nunca
soube o porquê de tal evento… é uma luz difusa, lenta, como que
surgindo a medo e com ela, um opaco silêncio… algo que nada traz a
não ser paz… mas vir com ela já é bom… e é nesses
momentos que me sinto só… e sabem porquê?… porque não tenho
com quem partilhar esse momento!… algo que sempre desejei fazer um
dia na minha vida: partilhar a minha solidão… dizer a alguém:
“…Vês?… Estás a ouvir?… A minha solidão está aqui, é
isto que vive aqui comigo… Entendes?…”… mas nunca consegui e
nunca o consegui porque nos momentos em que a solidão me visita eu
nunca estou acompanhado… engano, estar acompanhado estou mas apenas
de mim mesmo e dessa luz e desse silêncio… já somos três…
estendo-me então no leito dessa luz e deixo-me levar pelo barulho do
silêncio que me invade… nunca é tarde para experimentar novas
sensações, só que esta é já demasiadamente minha conhecida e
então apenas nos olhamos e nos aceitamos mutuamente… nada mais
fazemos senão partilhar aquele momento, uma partilha a três numa
solidão solitária de um só… estendido nela e com o silêncio
deitado a meu lado, olhamos o tecto que lentamente se separa de nós
em tons de cinzentos cada vez mais escuros… passo os braços pelo
silêncio e aperto-o de encontro ao meu peito… sinto o seu respirar
lento e compassado… é um som simpático, eu sei, mas ao mesmo
tempo ousado na medida em que invade o som do bater do meu coração…
e o silêncio deixa de ser silêncio para ser um baque surdo ritmado
aqui, ao meu lado, deitado… no entanto, continuo abraçado a ele e
ele sente-se bem porque acarinhado… é um abraço puro mas forte…
ingénuo mas apaixonado… é apenas um abraço de silêncio
compartilhado num leito de claridade a escurecer em lentos tons que
tem o anoitecer… porém, já quando o tecto se separa de nós e nos
abandona entregues que ficámos à luz das trevas que entretanto nos
envolvem, o silêncio se aperta contra mim e me possui… penetra-me
fundo e a respiração torna-se ofegante, sufocante… o que até
então era um prazer compartilhado passa a ser dor e algo que
corrompe… penetra-me cada vez mais fundo e a dor aumenta… o bater
e o som do meu coração ultrapassa o silêncio que entretanto se
esvai num orgasmo de sons delirantes de espasmos gigantes que se
avolumam dentro de mim… o tecto já não existe, a obscuridade
ainda persiste com mais intensidade… é um estar sem vida, sem
morte e sem idade… apenas habita em mim numa eterna cumplicidade…
respiro o espaço que me rodeia… e a escuridão cai sobre tudo e me
envolve como uma teia… já tenho mais uma companhia… o doce sono
vem de mansinho amparar meu corpo e cobre-o com carinho… adormeço
lento, extenuado de tanta amargura, numa vã procura do próximo
amanhecer que de novo me vai trazer o fim de tarde, neste terno ciclo
de amor e ódio em que espero pela eternidade…”
terça-feira, 16 de junho de 2015
REGAÇO
"...
deito a cabeça no teu regaço... olho-te a face serena... e teus
lábios sorriem... tuas mãos se envolvem nos meus cabelos e a
massagem leva-me ao sonho... fecho os olhos e deixo-me vogar no teu
corpo... dentro de ti... à tua volta... mesmo sem te tocar te
sinto... tuas mãos tocam o meu ser como se nos meus lábios
estivesse todo eu, como se a minha boca fosse todo o meu corpo...
teus dedos leves e suaves me transportam, nesse toque, para lá de
mim mesmo e me deixo ficar por momentos apenas nesse espaço, nesse
limbo, nesse suave sentir de seda e com sede de um beijo... é esse
beijo que acontece a seguir... é esse toque que me faz emergir de
mim para imergir-me em ti... apenas um leve sabor a pétala duma
qualquer flor... apenas um leve sabor e tudo o que nos rodeia a
seguir é tão-somente o amor..."
segunda-feira, 15 de junho de 2015
PRISIONEIROS
“…há
homens que vivem para amar… e então, amam tudo e todos…
despertam o amor em muitos seres mas nunca irão conseguir amar uma
só pessoa… esse homem tem em si o desejo de viver num pleno estado
de graça que o “Amar” lhe proporciona… esse homem que tanto
ama, que tanto vive para amar… é um ser solitário… porque
sofre… porque sempre insatisfeito… porque no meio de tanto e
tanto amar ele não consegue “sossegar” num único amor… passa
a vida a lutar pelo amor, passa a vida na constante procura do amor…
percorre todos os caminhos e nunca encontra o seu “graal”… vive
num eterno desejo de paz, de descanso do guerreiro… mas jamais o
encontrará… é um ser insatisfeito, porque o Amor que espalha á
sua volta é um círculo que o aprisiona e ele torna-se prisioneiro
dessa procura…”
domingo, 14 de junho de 2015
SINÓNIMO
“...
és sinónimo de paz, na palavra que me dás... és sinónimo de
beleza nesse olhar profundo sem mácula de tristeza... és sinónimo
de alegria no toque suave que em mim um teu sorriso cria... és
sinónimo de paixão quando disfruto o bater mais forte do meu
coração... és sinónimo de harmonia quando me beijas enlaçados em
sintonia... és sinónimo de luz quando no escuro da noite teu amor
me seduz... és sinónimo de serenidade quando no abraço matamos a
saudade... és sinónimo de ternura quando na partida o teu olhar em
meus olhos perdura... és sinónimo de puro amor quando nos afagamos
com a alma e os corpos sem pudor... és saudável loucura quando
sinto a nossa mútua procura e nos afogamos no delirar de um sentir
que tudo é tão simples quando sabemos porque é que nos estamos a
amar... és tudo o que um simples mortal busca na imortalidade que a
qualquer um ofusca no silêncio do grito que amaina a febre do ruído
que quebra tudo mesmo que fosse granito... és tudo o que o amor
busca no olhar, no toque, no beijo que de momento em momento se reduz
ao desejo, trazendo como prenda, tecido em flocos de doce renda, o
caminho percorrido como sempre desejado, obtido e que a luz em nossos
corações se acenda para num florir matinal ou num anoitecer normal,
o doce sabor nos acorde ou nos adormeça em profunda certeza que o
dia seguinte mais não será do que um novo fruir do amor que nos
envolve e a cada momento nos devolve na mais plena pureza do aceno
tão natural como há pouco sobre nós desceu... porque se te sinto
minha, sei que me sentes teu...”
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